Escola Marina Cintra: muros com alma

Nas manifestações artísticas a céu aberto, o que importa é o diálogo permanente entre os criadores e a sociedade.

No início dos anos 2000, uma escola estadual localizada em uma árida região de São Paulo, a Avenida da Consolação, ostentava em seus muros uma coleção de grafites, muitos dos quais feitos pelos próprios alunos. A E.E. Marina Cintra contrastava com outros muitos estabelecimentos públicos de ensino que tinham suas paredes vandalizadas ou semidestruídas em todas as regiões da capital, dos sofisticados Jardins à periferia.

O objetivo da direção da escola era justamente abrir um espaço de livre manifestação artística, que levasse alunos e a comunidade do bairro a desenvolver um sentido de pertencimento, uma identidade a partir do centro educativo que frequentavam.Era uma forma eficaz de humanizar, e proteger, um templo de ensino e convivência.

Por muito tempo, o colégio Marina Cintra foi um oásis de criatividade entre as escolas públicas e houve quem quisesse transformar a iniciativa em um projeto oficial, mas a ideia não prosperou, embora várias escolas tenham adotado a sugestão.

Porém, anos depois, o Poder Público não só enterrou a proposta como saiu pela cidade pintando de cinza os muros que continham representações de artistas consagrados, sufocando a mais democrática forma de expressão visual da grande cidade.

O exemplo do Marina Cintra ilustra com precisão o papel da arte urbana, ou street art, como instrumento de comunicação das novas gerações. Esta forma de cultura popular, que sempre existiu, mas que decolou de verdade na década de 1990, reproduz o próprio perfil das sociedades contemporâneas nas grandes metrópoles e, hoje em dia, também nos pequenos e médios municípios.

Nas paredes de galpões e terrenos abandonados, nos muros de grandes edifícios ou em qualquer espaço que permita um voo de criatividade, sempre haverá uma manifestação política, um protesto, uma contestação ou, em última instância, uma singela manifestação artística, poética ou bem humorada.

Ao aproximar a arte da comunidade, ocupando espaços de grande visibilidade, os artistas urbanos mudam a concepção clássica, e elitista, de acesso às manifestações criativas.

Beco do Batman – Imagem Google

Não por acaso algumas grandes capitais por todos os continentes revigoraram espaços públicos ao dar vazão a iniciativas de cultura popular com esse perfil. Shoredtich e Bethnal Green, no leste de Londres, viraram ícones da street art cultuada por jovens de todas as classes sociais em uma região antes marginalizada, inclusive pelos turistas, na capital inglesa.

No Lower East Side de Nova York, no 13º Arrondissement de Paris, no Wynwood de Miami, no que sobrou do Muro de Berlim e no cultuado Beco do Batman, no bairro de Vila Madalena, em São Paulo, os gênios criativos das ruas transformaram as paisagens urbanas em diálogos permanentes com a sociedade. Quem preferir o cinza é porque tem mais afinidade com a pré-história. E ainda não descobriu que os muros têm alma.

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